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24 julho 2013

A magia do frio... Só que não.

Sou filho de agricultores e sinto muito orgulho disso. Houve uma época em que não era assim. Quando criança, nem ligava para isso, e na adolescência era estupido, imaturo e superficial. Como qualquer adolescente comum. Emfim, desses adjetivos todos hoje sei que sou menos adolescente do que era... (bom, algumas certezas fazem bem de vez em quando, né?). Dando continuidade, nesses dias de frio intenso e com a mídia local toda voltada para esse fenômeno climático como se fosse a coisa mais importante que estaria acontecendo no momento, obviamente não tem como ignorar todo esse contexto "fantástico" (relativo à fantasia mesmo!) que se criou, ainda que passageiramente. Sendo minha origem da roça, tenho uma visão um tanto quanto menos "romântica" sobre esse assunto...
"Obrigado ao homem do campo..."
Em primeiro lugar ( e que não está relacionado com minha origem, mas sim com minha personalidade mesmo), me dá uma enorme tristeza perceber quão tendenciosa, adepta da parcialidade e dependente do sistema se tornou a imprensa nacional, nossos meios de comunicação como um todo. E vou até me abster de falar sobre os exageros e descabimentos em relação a cobertura da vinda do papa, pois é tanta crítica destrutiva misturada à um noticiário sensacionalista que me da até enjoo... Mas ok, pois o que mantém essa máquina "acefaladora" trabalhando é o maldito IBOPE mesmo, então... Enquanto que a questão do frio, da "beleza da neve" e "da magia das geadas", que são uma realidade que posso chamar de mais próxima, definitivamente tem um peso maior em virtude de afetar direta e objetivamente o andamento das atividades cotidianas da minha região.
Em segundo lugar, mas não menos importante, não sou nenhum ranzinza ( tá, só um pouco...) que simplesmente se posiciona contra "a magica" dos fenômenos naturais, muito pelo contrário. Claro que existe beleza em tudo relativo a natureza, até na morte existe beleza, basta que saibamos utilizar a ótica correta. Acho até que as pessoas confundem a grandiosa simplicidade do mundo natural com seus sonhos de consumo modernos, até o ponto de verem tudo com um romantismo vazio e uma nostalgia sem fundo de verdade, e se esquecem de que toda moeda tem dois lados. Cara, só o que escutei nos últimos três dias ( tanto na tv como na rua) foram comentários de estupefação e admiração e até comoção por causa da neve e da geada que caíram nos estados do sul e sudeste do país. Em especial aqui no Paraná. Só que ninguém falou ( talvez até porque a maioria não faça ideia mesmo...) de como ficaria a realidade dos pequenos produtores rurais que perderam toda sua colheita de hortaliças, de café, trigo, cevada,  ou dos produtores de leite de pequeno porte (como meu pai) que perdeu toda a pastagem que o gado teria para passar o inverno. Um senhor com quem conversava hoje ainda teve coragem de dizer "sim, mas veja bem, hoje tem rações, feno, silagem, insumos e todo tipo de coisa que podem substituir a pastagem quando isso acontece". Sim claro. Tudo dá em árvore então! Como se fosse simples assim...
Olha que "mágica" a expressão desse
rosto...
Estou falando do pequeno produtor, que vive das suas subculturas com um custo já bastante elevado e com uma margem de lucro bem precária, e não consegue fazer reservas para se preparar para as "magias eventuais" que sempre acabam por vir. Lembrando que esta impossibilidade de guardar reservas devemos em grande parte ao nosso tão estimado governo que privilegia seus queridos programas de (remediação!) "bolsa-tudo-quanto-é-coisa" e se esquece, como se praticamente não existissem, daquela parcela desgraçada da população brasileira que parece só servir para pagar impostos, vulgarmente chamados trabalhadores, castigando-os (nos) com cargas excessivas, exorbitantes de taxas e impostos. Nem falar na falta de programas de subsídios para os pequenos agricultores, que não fossem pelas linhas (deficientes) de crédito oferecidas pelas cooperativas de créditos (que estão na moda e proliferando como vírus aqui no sul) e Banco do Brasil, estariam totalmente abandonados.
Eu, em outra vida?
Bom, sendo assim, peço minhas sinceras desculpas por não partilhar dessa visão romântica do frio e sua "magia", como quer fazer parecer a mídia e parecem querer acreditar a maioria das pessoas. Com certeza, na semana que virão nos noticiários haverão manchetes sobre as "perdas ocasionadas pela geada", e toda a beleza que haviam anunciado dias antes será como se nunca houvesse existido. Cômico...E olha que sempre gostei de épocas frias, mais do que das quentes (devo ter sido um inuit em alguma outra vida). Quer saber como "sentir a magica na pele" ? Levante as 05:30 da matina e vai lidar com as vacas, tirar leite, mexer com água fria, andar no barro e todas essas coisas "mágicas" que tem para fazer numa propriedade rural qualquer. Já fiz isso, muitas vezes. E sinceramente, não consigo olhar a grama  coberta de gelo sem visualizar em minha mente a tristeza nos rostos sofridos dos agricultores que tiveram perdas significativas em suas pequenas lavouras e pastagens, muitas e muitas vezes, fonte única de renda de toda uma família. Quanto à meu pai, perdeu sua pastagem, e vai ter que se virar com feno e alguma ração suplementar. Mas ele é um guerreiro, e nunca baixa a cabeça, nem se dá ao luxo de reclamar. Essa não foi a primeira, tampouco será a última.Vai superar mais essa, tenho certeza. O que ninguém faz conta é de quantos anos ele vai levar para se recuperar desse baque...

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